No Brasil, legislação, jurisprudência e
atuações muitas vezes desproporcionais dos órgãos fiscalizadores criam um
verdadeiro muro de contenção, quase intransponível, que inibe drasticamente a
participação de gestores já experimentados e bem sucedidos na iniciativa
privada, ou mesmo com notória capacidade técnica dos quadros do poder público, colaborando
para que as opções postas à sociedade durante os pleitos eleitorais sejam
sinônimo de mais do mesmo.
De pronto, não está se defendendo flexibilização
das regras legais a ponto de permitir que maus gestores a utilize a seu bel
prazer. Contudo, é certo que, atualmente, a necessária segurança jurídica que
todo gestor público almeja ter nem sempre é possível alcançar, pois,
infelizmente, por mais “pacificado” que esteja uma determinada matéria, sempre
existe a possibilidade de se puxar um “princípio
qualquer da manga” e ver uma importante atividade de governo ser obstruída
por uma decisão judicial, dos tribunais de contas ou mesmo por uma
“recomendação” ministerial.
A intensa e rápida transformação social,
cultural, política, tecnológica pela qual a sociedade atravessa exige do gestor
público importantes tomadas de decisões para intervenções imediatas que nem
sempre são compatíveis com a natural burocracia estabelecida pela lei de
licitações (Lei 8.666/1993). Em outras palavras, falta criatividade legislativa
para criar regras legais que protejam o bem público, mas, ao mesmo tempo,
proporcionem alternativas ágeis aos gestores públicos quando estes se deparam
com situações emergenciais que exigem uma resposta imediata do poder público,
porém, sem esquecer da segurança jurídica que esse gestor necessita no momento
de tomar a decisão.
O Brasil possui um preocupante emaranhado
de leis, precedentes judiciais contraditórios, orientações oscilantes de
tribunais de contas e opiniões individuais de membros do parquet, muitas vezes contraditórias com a jurisprudência nacional
dominante, que, além de não ajudar a mostrar os caminhos corretos a seguir
(especialmente em situações emergências), colaboram para engessar a máquina
pública que já possui uma rotação lenta por natureza.
Como bem explanou o ministro Dias Toffoli,
presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), em
palestra ministrada em Washington, DC (EUA):
“não são 11
cabeças iluminadas, ou meia dúzia – que é o que forma a maioria – que são
capazes de discutir o futuro do Brasil”. E completou: “temos que julgar o
passado. Quem julga o presente é o Executivo (…), e quem julga o futuro é o
Congresso (…). Não podemos atropelar a Constituição e as garantias
individuais.”
Seguindo o entendimento do presidente da
mais alta corte judiciária do Brasil, onde o Judiciário julga o passado, o Legislativo o futuro e o Executivo o
presente, pergunta-se: sobre qual dos três poderes recai a
responsabilidade permanente de se tomar as decisões mais rápidas, que impactam
imediatamente a sociedade e, por isso, está mais suscetível a falhas e exposto
a responsabilização?
Por óbvio, é o Poder Executivo.
Sobre o chefe do Poder Executivo recai a
responsabilidade permanente de se tomar as mais variadas decisões sobre tudo
que envolve a coletividade e, na maioria das vezes, num curto espaço de tempo.
Isto posto, durante um mandato de quatro anos, um prefeito, governador ou
Presidente da República precisa tomar dezenas, centenas, milhares de decisões.
Ocorre que a combinação entre a
responsabilidade hercúlea que recai sobre os ombros do chefe do Executivo, que
precisa tomar decisões importantes e emergenciais, somada com a instabilidade
jurídica vivenciada no Brasil equivale à possibilidade real de responder por
inúmeras e infindáveis ações judicias, bem como aguardar e responder anos e
anos pela apreciação de suas contas pelos tribunais de contas, desestimulando,
dessa forma, o ingresso de novos gestores na Administração Pública.
CASO
CONCRETO: PREFEITO JOÃO DÓRIA (ATUAL GOVERNADOR DE SÃO PAULO)
Para exemplificar a vulnerabilidade
jurídica de um chefe do poder Executivo, citamos o caso ex-prefeito da cidade
de São Paulo, João Dória (hoje Governador do Estado de São Paulo). Dória foi
eleito prefeito de São Paulo nas eleições 2016, assumindo o cargo em 1º de
janeiro de 2017. Durante a campanha, Dória destacou que combateria firmemente a
prática das pichações que tanto “sujam” a imagem da cidade.
Ao tomar posse, o prefeito João Dória
desencadeou um programa de combate à pichação e, entre outras medidas, removeu
grafites que estavam cobertos por pichações de um corredor de determinada
avenida e, em seu lugar, implantou um “corredor verde”.
Pois bem, querem saber o resultado dessa
decisão administrativa, de quem foi eleito pelo voto popular para tomar as decisões
(lembrando que decisão alguma terá aprovação unânime)??? Resposta: João
Dória foi acionado judicialmente e foi condenado a pagar impressionantes R$ 782.000,00
(setecentos e oitenta e dois mil reais).
Levando em consideração que o “salário
líquido” de João Dória, quando prefeito de São Paulo, era de R$
17.948,00 (dezessete mil novecentos e quarenta e oito reais) mensais, para
pagar o valor da condenação o prefeito teria que utilizar quase todos os seus
salários em quatro anos de gestão, o que alcançaria o montante de R$ 861,504,00
(oitocentos e sessenta e um mil quinhentos e quatro reais). Isso somente em uma
única ação judicial.
Na sentença, o juiz afirmou que Dória e a
prefeitura cometeram “ato de censura” e causaram danos ao patrimônio público ao
apagar os grafites, além de ter cometido atos administrativos ilegais e
inconstitucionais”. Para o magistrado, a colocação de um muro verde no lugar
onde havia os grafites (que estavam cobertos por pichações) censura a
manifestação que havia ocorrido antes.
Como se vê, as decisões administrativas,
por mais bem-intencionadas que sejam, são sempre passíveis de questionamentos
judiciais. Contudo, o mais preocupante é que tais questionamentos podem ser
deferidos pelos órgãos que possuem a competência para apreciá-los.
O Blog acredita que João Dória conseguirá
reverter tal sentença em grau de recurso.
Diante desse cenário, o blog pergunta: tem
algum gestor, leitor do Café com Política,
interessado em disputar as eleições 2020 e, se eleito, assumir uma gestão
municipal?
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